"Todos
nós temos opiniões radicais. Mas dificilmente verbalizamos a maior
parte do que pensamos, pois fomos ensinados a conviver com uma espécie
de autocensura. David Granger (em The reason you're alive) é um
personagem audacioso, que diz o que pensa, e que teve esta
característica acentuada após uma cirurgia no cérebro. No entanto, por
sempre dizer a verdade, podemos enxergar a humanidade de seu caráter.
Afinal, ao mesmo tempo em que revela o pior de si, David nos faz
acreditar na bondade de seu coração através das boas ações realizadas ao
longo da trama. De forma irreversível, vivemos em uma cultura que pune
todo aquele que não abre mão de suas verdades pessoais. Eu
particularmente penso que viveríamos melhor se convivêssemos com a
diversidade de opiniões ao invés de fomentarmos o impulso de
silenciá-las. O discurso de David é formado por diversos ideais que eu
pessoalmente não concordo, mas foi libertador apresentar ao leitor as
razões de todo este pensamento.
(...)
Muitas pessoas estão apenas interessadas em histórias que confirmam
aquilo que elas já acreditam ou que apresentam uma narrativa política
com a qual simpatizam. Eu certamente já fui uma dessas pessoas, no
passado, porque é muito mais fácil ser assim do que ser solidário à
inconsolável dor de um veterano de guerra, por exemplo." (Trecho de entrevista de M. Quick)

Matthew Quick é um autor norte-americano conhecido por suas histórias dedicadas ao público young e new adult. Seu primeiro livro, O lado bom da vida (The Silver Linings Playbook), foi publicado em 2008 e adaptado para o cinema em 2012. No Brasil, a Editora Intrínseca adquiriu os direitos de quatro de suas obras: O lado bom da vida (lançado apenas em 2013), Perdão, Leonard Peacock (2013), Quase uma rockstar (2015), A Sorte do Agora (2015) e Garoto 21 (2016). Outros títulos ainda não lançados no Brasil: Love may fail (2015), Every exquisite thing (2016) e The reason you're alive (2017).
Uma característica comum às obras de Quick é a predominância de personagens cuja vida presente é diretamente afetada por um acontecimento passado, que tanto pode ser condição de trauma emocional e/ou físico ou ainda genético. No entanto, é possível encontrar instantes de superação, coragem e otimismo em quase todas as tramas (exceto em Perdão, Leonard Peacock). Mesmo diante de toda adversidade, Matthew Quick cria narrativas onde somos convidados a refletir sobre a forma com que lidamos com nosso próprio cotidiano e como podemos nos tornar (ou não) melhores a cada dia. Sobrevivência e esperança também são palavras-chave em seus livros.
Nosso desejo é que o leitor possa também nutrir grande empatia por estas histórias! Vamos conhecer então a bibliografia do autor?
O lado bom da vida
Sinopse: Pat Peoples, um ex-professor na casa dos 30 anos, acaba de sair de uma instituição psiquiátrica. Convencido de que passou apenas alguns meses naquele "lugar ruim", Pat não se lembra do que o fez ir para lá. O que sabe é que Nikki, sua esposa, quis que ficassem um "tempo separados".
Tentando recompor o quebra-cabeça de sua memória, agora repleta de lapsos, ele ainda precisa enfrentar uma realidade que não parece muito promissora. Com o pai se recusando a falar com ele, a esposa negando-se a aceitar revê-lo e os amigos evitando comentar o que aconteceu antes de sua internação, Pat, agora viciado em exercícios físicos, está determinado a reorganizar as coisas e reconquistar sua mulher, porque acredita em finais felizes e no lado bom da vida.
Opinião: Acredito que todo mundo tenha já assistido O lado bom da vida nos cinemas e, como esperado, já deve saber que o livro é capaz de nos surpreender bem mais que o filme (que é uma boa adaptação, sem dúvida), principalmente em seus capítulos finais, onde Pat Peoples torna-se mais consciente acerca de sua saúde emocional e, inclusive, considera possível reconciliar-se com o seu passado e criar alguma expectativa de futuro e sobrevida.
Perdão, Leonard Peacock
Sinopse: Hoje é o aniversário de Leonard Peacock. Também é o dia em que ele saiu de casa com uma arma na mochila. Porque é hoje que ele vai matar o ex-melhor amigo e depois se suicidar com a P-38 que foi do avô, a pistola do Reich.
Mas antes ele quer encontrar e se despedir das quatro pessoas mais importantes de sua vida: Walt, o vizinho, fumante inveterado e obcecado por filmes de Humphrey Bogart; Baback, iraquiano que estuda na mesma escola que ele e é um virtuose do violino; Lauren, a garota cristã de quem ele gosta, e Herr Silverman, o professor de alemão que está agora ensinando à turma sobre o Holocausto e que desempenha um papel crucial na vida de Leonard quando o jovem se aproxima do seu ato final.
Encontro após encontro, conversando com cada uma dessas pessoas, o jovem ao poucos revela seus segredos, mas o relógio não para: até o fim do dia Leonard estará morto.
Opinião: De todos, o enredo mais "pesado" de Matthew Quick, pois é uma história narrada em "tempo real", que segue a ordem dos fatos e considerações de Leonard a respeito de uma iminente morte e suicídio. Pode ser considerado um livro "sem final", ou um livro com um "final em aberto", o que o diferencia de todos os outros títulos de Quick.
Quase uma rockstar
Sinopse: Amber Appleton tem dezessete anos, está no ensino médio e mora em um ônibus. Desde que o namorado da mãe as expulsou de casa, Amber, a mãe e Bobby Big Boy, o leal vira-lata da adolescente, estão acampados no Amarelão, o transporte escolar que a mãe de Amber dirige. Apesar de as coisas não estarem boas para o seu lado, Amber, que se autoproclama Princesa da Esperança, se recusa a desistir.
Em vez disso, ela foca todas as energias em ajudar as pessoas à sua volta: incluem-se aí a mãe alcóolatra, os amigos estranhos e excluídos, o Padre Chee e as Divas Coreanas por Cristo, uma octogenária cega e pessimista e um veterano de guerra solitário que escreve haicais. Mas quando uma tragédia faz seu mundo desabar por completo, Amber não consegue mais enxergar a vida com os mesmos olhos. Será que no meio de tanta tristeza e sofrimento ela vai recuperar a esperança?
Opinião: Amber Appleton é de todas a personagem que mais sofre nas histórias de Quick. Impossível não chorar a cada episódio extremamente trágico por que passa nossa protagonista (Amber lembra um pouco Eleanor, de Eleanor & Park, principalmente pela precariedade de suas relações familiares). No entanto, o autor nos surpreende com uma personagem de força inimaginável, que consegue resistir aos absurdos da existência e ainda trazer um pouco de esperança aos poucos amigos que encontra pelo caminho. Quase uma rockstar tem ainda um dos finais mais surpreendentes e bonitos de toda a bibliografia M. Quick.
A sorte do agora
Sinopse: Bartholomew Neil passou todos os seus quase 40 anos de vida morando com a mãe. Depois que ela adoece e morre, ele não faz ideia de como viver sozinho. Até que um dia, ele encontra, na gaveta de calcinhas da mãe, uma carta de Richard Gere. Convencido de que isso só poderia ser um sinal cósmico, Batholomew passa a escrever uma série de cartas íntimas ao ator, acreditando que ele vai ajudar. De Jung a Dalai Lama, de filosofia a fé, de abdução alienígena a telepatia com gatos, tudo é explorado nessas cartas que não só expõem a alma de Bartholomew, como, acima de tudo, revelam sua tentativa dolorosamente sincera de se integrar à sociedade.
Considerado por diversos veículos um dos melhores livros de 2014, entre eles a Entertainment Weekly, a Publishers Weekly e a Cosmopolitan, o novo livro do autor de O lado bom da vida é original, arrebatador e espirituoso. Uma história comovente e engraçada sobre família, amizade, luto, aceitação e Richard Gere.
Opinião: Bartholomew Neil é um personagem de uma empatia que beira à ingenuidade, especialmente em ocasiões relacionadas ao amor e à amizade. Apesar das adversidades, este "bom sentimento", aliado a uma crença na Boa Sorte, será a força necessária para Bartholomew recomeçar a sua vida e, junto a novos e inesperados amigos, finalmente encontrar seu lugar e voz no mundo.
Love may fail
Sinopse: Portia Kane está em um momento de crise. Após uma traição em seu casamento, Portia desistiu de sua luxuosa vida na Flórida e voltou para South Jersey, um lugar que parece não ter mudado com o tempo e que a faz lembrar de uma infância nada feliz. Sozinha e sem rumo, porém acreditando que o Bem inda possa existir neste mundo, Portia decide reencontrar a única pessoa que um dia a encorajou: Mr. Venon, seu querido professor de inglês, que foi forçado a abandonar sua carreira após um incidente em sala de aula, vivendo hoje em um lugar isolado, só e sem dinheiro.
Poderá uma freira "descolada", um ex-viciado em heroína, um jovem metaleiro e uma mãe nada convencional consolar (ou magoar de vez) o coração de Portia e ajudá-la nesta missão de ajudar Mr. Venon e, com isto, recuperar a esperança na humanidade? Love may fail é uma história que revela os altos e baixos de toda existência: ou seja, a dor e a ousadia de se tornar aquela pessoa que, lá no fundo, você sempre quis (e foi destinada a) ser.
Opinião: Um dos pontos mais interessantes da história é a consciência de que muitas vezes chegamos à vida adulta já sabendo que dificilmente realizaremos os sonhos de nossa juventude (no caso de Portia Kane e Mr. Venon, havia o sonho de se tornarem escritores "de verdade"). Dividido em quatro partes, a história é narrada por Portia Kane, Nate Vernon, Sister Maeve Smith e Chuck Bass. Há uma conexão entre todos os personagens e a amizade e o apoio emocional compartilhado pelos quatro é o que faz com que hajam motivos para continuar vivendo. Mr. Venon é o personagem que sofreu mais injúrias em seu passado, e é em torno de sua memória e sobrevivência que a trama de M. Quick dedica a maior parte de seus capítulos. O livro tem ainda atmosfera que se aproxima de Quase uma rockstar, principalmente por ter esta memória do ambiente escolar e personagens que, no desfecho da história, encontram motivos para reconstruir suas vidas. Não é meu livro preferido mas é impossível não sentir empatia por Portia Kane e seus sonhos, confusões e confissões.
Every exquisite thing
Sinopse: Nanette O'Hare é uma jovem retraída que mantém o seu papel de filha obediente, estudiosa e exímia atleta. Mas, ao receber de um estimado professor um exemplar usado de The Bubblegum Reaper - uma misteriosa obra cult já fora de catálogo, a rebeldia que poderia haver em Nanette desperta.
Ao iniciar uma amizade com o recluso autor, Nanette se apaixona por um jovem e problemático poeta que também se tornou aficcionado por The Bubblegum Reaper. Ao encontrar no amor e na literatura a força necessária para confrontar o mundo, Nanette descobrirá sua verdadeira vocação, e igualmente entenderá que é preciso pagar um alto preço para viver o melhor de sua vida.
Opinião: Uma história que nos faz lembrar a angústia existencial de Leonard Peacock em seu cotidiano familiar e escolar. No caso de Every exquisite thing, ainda que sua protagonista viva em um contexto social menos traumático, Nanette superará suas angústias apenas após dedicar-se à literatura, muito embora esta proximidade com a escrita se apresente como um sinônimo tanto para a vivência de um grande amor como para o testemunho de uma impensada tragédia. O desfecho da trama, no entanto, tem na superação uma de suas principais características, e mantém a crença na criação e na arte como possibilidade de sobrevivermos ao vazio.
The reason you're alive
Sinopse: Matthew conta a história de David Granger, um soldado veterano da Guerra do Vietnan. Aos 68 anos, além das memórias e chagas de seus tempos de combate, David sofre um acidente de carro e, após inúmeras cirurgias, passa a conviver com uma nova cicatriz: um tumor cerebral, possivelmente fruto de sua exposição às armas químicas do passado.
Em algum momento da recuperação, David passa a repetir nomes e eventos desconexos para os de seu convívio, porém, para nosso protagonista, esta profusão de lembranças será a chave para solucionar os fatos e feridas remanescentes de seu passado, tanto como os de sua atual relação com Hank (o filho distante), Ella (sua neta) e Sue (o melhor amigo).
Nas palavras do autor, The Reason You're Alive afirma o quanto nossos segredos e dívidas do passado podem definir o nosso presente, assim como também nos desafiar a enxergar além de nossas limitações e buscar ser uma versão melhor de nós mesmos a cada dia.
Opinião: Eu apenas torço para que a opinião pública norte-americana não esteja considerando o autor como uma "persona non grata" após a publicação de The reason you're alive. Nestes tempos onde não se pode manter uma opinião ou gosto sem que hajam
E você, conhece (e coleciona) os livros de Matthew Quick? Conta pra gente sua experiência :)
Até a próxima!
Rebeca C.
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