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janeiro 24, 2016

[Resenha] Garota Imperfeita - Simmone Howell


I am not the person who is singing, (Não sou voz que canta)
I am the silent one inside. (mas o canto silencioso aqui dentro)
I am not the one who laughs at people's jokes, (Não sou a plateia dos que entretém com piadas)
I just pacify their egos. (mas meu riso apazigua seus egos)
I am not my house, my car or my songs, (Minha casa, meu carro, minhas canções não me definem)
They are only stops along my way. (são apenas estadas em minha jornada)
I am like the winter, I'm a dark cold female, (Sou como o inverno, mulher de escuridão intensa)
With a golden ring of wisdom in my cave. (iluminada por alma clara, nas profundezas sábia)

Paula Cole, Me
(livre tradução)



Por viver em uma cidade grande, tenho fascínio por histórias onde faltam a multidão e o engarrafamento. "Histórias de tédio", dirão os amigos de geografias distantes; por que romantizar o interior? Talvez por ser a solidão da praça a mesma do topo do edifício, e portanto acolhedora quando confrontada com este algum sentimento de jornada ou fuga - ainda que a realizemos do quarto para a estrada ou da fazenda para a metrópole ou da página do livro para algum pedaço do coração.

Havendo movimento, sentimo-nos inquietamente vivos. Ou particularmente presos. Porque há tempo para todas as coisas e uma delas é a de nos sentirmos viajantes - até o dia em que não mais acreditarmos em estradas e impermanências.

(Saudade e pertencimento: duas ideias igualmente à espera, e não apenas de tradução.)

Nancy talvez não seja o seu nome, ainda que a cada mudança permaneça a mesma, apenas uma garota, à espera de um mundo para admirar e ser por ele eternizado. Skylark, protagonista do livro mas não de sua vida, é por algum tempo melhor amiga de Nancy, em um compartilhar de histórias e deriva, nesta solidão-acompanhada que começa lá pelos oito ou quinze anos e por vezes se estende por toda uma vida.

Garota Imperfeita é uma história de poucos personagens, bem representada por Sky, Bill (seu pai), Gully (o irmão), Nancy e também Luke, o forasteiro, cujos dias são também de poucos atos e sobrevida, nesta velha cidade de Saint Kilda, num pequeno litoral australiano, onde o reconhecimento da multidão se dá apenas nos meses de verão, com a chegada dos turistas, ou quando algum dos personagens diz adeus e segue em uma odisseia de cartões postais e novas-vidas.

Garota Imperfeita é também uma aventura de Simmone Howell, autora dos arredores de Melbourne, que como Sky trabalhou em uma loja de discos, em meio ao tédio e às canções de sua vida. E quando a escrita é assim passado e agridoce, é provável que o leitor a entenda enquanto confidência, ou como a melhor versão do que gostaríamos de ter vivido.

Biográfica ou não, esta é uma das obras young adult mais interessantes do gênero música e vida comum como protagonistas. E porque a vida é assim habitual e indistinta, é preciso encontrar aquela Nancy-Sky-menina, de sentimentos miúdos porém profundos, que transborda das páginas e de nós mesmos, e transforma-se em canção dissonante ou favorita, no coração da cidade ou em qualquer monotonia. E Garota Imperfeita é um bonito exemplo literário de tudo isso.



Sinopse: "Nós, a família Martin, éramos como super-heróis ao contrário: nossos defeitos nos definiam. Meu pai era viciado em cerveja e gravações raras. Gully tinha 'dificuldades sociais', que ficavam evidentes pelo fato de ele usar uma máscara de focinho de porco vinte e quatro horas por dia. Por fora, eu parecia estar bem, mas por dentro havia um bizarro caldo hormonal cozinhando em fogo brando. Meus defeitos não eram do tipo que se podia perceber só de olhar."


Simmone Howell, Garota Imperfeita. SP: V&R Editoras, 2015

13 comentários:

  1. Seu texto é uma delícia, isso não é resenha é um crônica literária! Que jeito de apresentar um livro! Putz! Fiquei com muita vontade de ler o livro, sou uma leitora que gosta de mergulhar em introspecção, que gosta dos autores que abordam multidões de 1 de vez em quando.


    Pandora
    O que tem na nossa estante

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  2. As pessoas superestimam a vida na cidade grande e seus agitos, tumultos, correrias, milhões de compromissos a cumprir com um milhão de pessoas diferentes... Quando na verdade, o que importa, na metrópole ou no interior, é a vida verdadeira que nós levamos, conosco apenas e com os poucos que conseguem encontrar o caminho até "essa Nancy-Sky-menina, de sentimentos miúdos porém profundos, que transborda das páginas e de nós mesmos, e transforma-se em canção dissonante ou favorita, no coração da cidade ou em qualquer monotonia".
    Bjo, bjo
    https://ameninaquenaoparadeler.blogspot.com.br

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    Respostas
    1. não sei mais calcular a cor das horas
      as coisas me ampliaram para menos
      a lua faz silêncio para os pássaros
      -e eu escuto esse escândalo!

      eu sou muitas pessoas destroçadas
      ele me coisa, ela me rã, ele me àrvore
      e me disseram que as coisas que não existem são mais bonitas

      (Manoel de Barros)

      <3

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    2. "As coisas que não existem são mais bonitas" quando palavras aleatórias se unem e expressam sentimentos aparentemente inexprimiveis.
      <3

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  3. Oi Rebeca! Fiquei super encantada pela forma que você escreve, essa com certeza foi uma das melhores resenhas que já li!
    Esse livro me parece ser incrível, gostei demais do tema abordado e a ilustração da capa me chamou muito a atenção, é maravilhosa!
    Um beijão!
    vishamiga.blogspot.com

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    1. Oi Milena! Fico feliz que tenha se identificado com meus comentários e leituras! <3 Espero que logo logo você também tenha a oportunidade de conhecer este livro lindo!

      Obrigada pela visita! Seja bem vinda :)

      Bjs

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  4. Menina Rebeca tem que parar de fazer resenhas incríveis, assim não vai ter wishlist que aguente hahahha

    Gostei muuuuuuuito da sua resenha e essa parte "a solidão da praça a mesma do topo do edifício". AI me matou.

    Muita lindeza <3
    Um beijooo,
    Paloma
    surewehaveablog.com.br

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    1. Oi Pah! Me divirto viu rsrs. Mas olha, nossa missão neste mundo é criar wishlists! E vocês manjam dos livros fofo-cool com aquele pé no tristinho que eu adoro! Também to querendo pelo menos uns cinco já postados no Sure! Tá fácil não, jovem! rsrsrs :D
      Bjocas!

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  5. Adorei seu post amore! Achei a capa deste livro sensacional e super linda ♥

    Beijos,
    ingridmedeiros.blogspot.com.br

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    1. Oi Ingrid! Obrigada pelo carinho e pela visita <3 Teu blog tem muita coisa bacana também, já curti *__*
      Bjs

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  6. Oi, Rebeca!
    Eu não conhecia o livro. Também me encantam essas histórias situadas longe das buzinas e engarrafamentos. A capa é linda, tem música no meio e desconfio que um tom melancólico. Já gostei!

    Beijos, Entre Aspas

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    1. Oi Carla :) Não encontrei a capa original em inglês pra saber se a conexão com a história é tão incrível assim, mas o clima é bem esse, melancólico e belo, e com este universo dos discos e romancinhos. Vale mesmo colocar na wishlist e aguardar a próxima black friday <3
      Bjs

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  7. Quando vi você postar foto desse livro no ig, fiquei com vontade de ler ;) Vou atrás :)
    Amei o seu novo blog :)

    www.blogdahida.com

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