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março 12, 2017

Este momento - Uma crônica de Gih Medeiros


Outro dia presenciei uma cena que inicialmente me provocou vontade de rir, mas depois me deixou de queixo caído: fui a uma clínica perto de casa, pois não me sentia bem, e enquanto aguardava minha vez, observei um casal que também aguardava uma consulta. A mulher parecia ser mais nova que eu e estava grávida, a barriga já proeminente, pois ela é do tipo magrinha. O homem, que intuí ser seu esposo, andava de um lado para o outro, inquieto e nervoso, ameaçando ir embora e queixando-se em voz alta da demora em serem atendidos. Confesso que a atitude dele me irritou um pouco (leia-se: bastante! Mas eu estava mal e, assim como eles, só queria ir embora logo) e às outras pessoas que estavam na recepção na mesma situação que nós. Creio que o pensamento da maioria, devia ser a irritação com quem quer ganhar tudo “no grito”.

Mas, quantas e quantas vezes, nós também já não fizemos ou agimos de modo semelhante?

A começar pela infância, quando a palavra PACIÊNCIA parece não existir em nosso vocabulário, e queremos os brinquedos e os doces imediatamente, e nos queixamos/resmungamos audivelmente, quando o colo ou mais uma história antes de dormir nos é negada. Que coisa mais injusta, não é mesmo?

E na adolescência/inicio da juventude, quando nossas prioridades se distorcem e já não sabemos mais quem somos, nem para onde vamos, mas temos de ser ouvidos, temos que abrir espaço à força, e o fim do mundo acontece todas as noites, quando finalmente nos damos conta de que não alcançamos nossos objetivos. Isso sem contar o esforço demandado no processo de conquista e a frustração por se sentir invisível em meio a um mar de gente. “Como ele(a) se atreve a não me olhar ou gostar de mim?” alguns podem pensar presunçosamente (atitude que acaba sendo perdoada, afinal, somos tão jovens).

E o que dizer de nossa vida adulta, onde tudo tem de ser para ontem!!! A correria dos dias nos impulsiona em uma rotina maluca, onde o cumprimento de prazos e a logística de trabalhar, cuidar da casa e da família, parece uma missão impossível a cada amanhecer, ainda que o suspiro de satisfação por ter dado conta de tudo seja a última ação do dia.

E assim somos levados pela corrente, não enxergando muita coisa ao nosso redor, a menos que esteja dentro de um raio de 30 cm de distância. E eu me pergunto: por quê?

Porque é tão difícil fazer as nossas obrigações com mais tranquilidade? Porque não olhamos 5 segundos para o lado e observamos quem está ali? Que urgência é essa que nos arrasta/empurra pelos dias, fazendo-nos dispersar pelo caminho e não enxergar de fato o mundo e a nós mesmos?

Mas, de onde vieram tantos questionamentos, vocês podem se perguntar.

Ao final da consulta, aquele casal citado no início desse texto, saiu emocionado da sala, ambos com sorrisos iluminados e lágrimas nos olhos. Acredito que devem ter feito um exame de imagem pela primeira vez e estavam tão felizes que era impossível conter o que sentiam. E aquele homem que há poucos minutos estava irritando a todos com sua rudeza nos fez respirar mais fundo ao compartilhar sua alegria conosco, um bando de estranhos, agradecendo em voz alta a Deus pela dádiva recebida.

Eu não sei qual é a história dessa família. O que eu sei é que naquele dia a atitude deles me fez olhar para mim mesma e me perguntar por que eu não estava valorizando as pequenas alegrias de cada dia: como um por do sol na saída do trabalho, que parecia ter sido pintado no céu especialmente para mim, com uma maravilhosa mistura de cores quentes e frias, deixando um gostinho de saudade pelo fim do horário de verão. Ou um bate papo pelo Whatsapp com os amigos, já que cada um vive em um recôndito de São Paulo e adjacências, mas que parece com nossas conversas ao vivo, repletas de riso e familiaridade. Ou ainda o simples prazer de ouvir músicas que há tempos eu não escutava e que me transportam a outros tantos tempos.

Naquele dia, eu fui exortada mais uma vez a recordar que o que importa não é o que a gente pode vir a ter ou não e sim, valorizar aquilo que temos, aquilo que sentimos, aquilo que vivemos. Agora, neste momento.

Não é sobre chegar no topo do mundo
E saber que venceu
É sobre escalar e sentir
Que o caminho te fortaleceu
É sobre ser abrigo
E também ter morada em outros corações
E assim ter amigos contigo
Em todas as situações

Trem Bala, Ana Vilela 

2 comentários:

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