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agosto 26, 2015

Complexo de Jonh Green

Como este blog já começou "começado", com conversas iniciadas lá no Instagram, seguiremos agora com um assunto-polêmica que eu não consegui não comentar: Livros que começam fofos e terminam em tragédia.

Sem muitos spoilers, prometo.


John Cusack em Alta Fidelidade

A História da Literatura (Cinematográfica) é repleta de produções onde o amor supera toda e qualquer adversidade. De Romeu e Julieta aos 83732872 enredos de Nicolas Sparks (como Um amor para recordar, um dos campeões cinematográficos de lágrimas), grande é a lista de tragédias-da-vida-humana com as quais podemos nos identificar. E mal não há nesta literatura da razão e da sensibilidade, principalmente quando esta nos proporciona uma experiência para além do entretenimento.

Mas o que há alguns meses me incomoda é esse boom editorial de narrativas trágicas¹, feitas de acidentes de carro e suicídios aos moldes de um poeta moderno. Veja bem, não quero com isso diminuir a intensidade e importância dos fatos trágicos de nossas vidas; externá-los por meio da arte pode ser a coragem que precisamos neste processo de cura, aceitação, sobrevivência, enfim. Só tenho dúvidas se a dor como processo criativo é apenas um fetiche mercadológico (pois já que A Culpa é das Estrelas virou um clássico, 'bora escrever e lançar outras quarenta histórias do gênero) ou se retrata uma real experiência do autor (como dito no prólogo de Por Lugares Incríveis, obra que, inclusive, foi o motivo deste texto aqui). Ou ainda: seria a dor uma preferência estética do autor, a ser percebida ao longo de seus títulos e em seu estilo de escrita?


Nicole Kidman em As Horas


Sei que minha bronca talvez seja por ter gostado totalmente de A Culpa é das Estrelas e de ter 'dedicado' a John Green o meu Prêmio Jabuti de Livros Trágicos Absurdamente Bem Escritos (com uma única ressalva: Quem é voce, Alasca?, que tem algum pé na categoria-tema deste texto, a saber, Livros que começam fofos e terminam em tragédia e que me decepcionaram profundamente), daí ser um pouco cansativo iniciar a sinopse de um novo livro e encontrar mais uma história onde 'um acontecimento inesperado irá mudar a vida de John e Kate para sempre".

Mas talvez esta seja a percepção de quem não conhece profundamente todos os lançamentos recentes de todas as Editoras possíveis. No entanto, esta é também a percepção de quem vive neste novo estilo de época² literário, ou melhor, nesta alguma nova identidade editorial dos anos 2014 e 2015, que tanto resgata uma cronologia de crepúsculos como distopias vorazes, e ainda encontra espaço pra toda uma categoria de alegrias e términos, de modo a atender a todo e qualquer leitor possível. E ok por isso! Sério. Pois triste seria um mundo ainda mais 1984 e Fahrenheit 451 (ou seja, onde algum Governo determine o que pode - e se eventualmente poderá - ser lido). Enfim, que a cada dia hajam novos autores, novos leitores, novos gostos e novas editoras. Há todo um momento bem positivo pra existência de tudo isso.

Mas o que incomoda mesmo é aquele vício textual de décadas (quiçá séculos) onde a mocinha sempre encontrará uma carta de seu amado escrita no dia anterior à tragédia que iria mudar suas vidas pra sempre. (Quantos livros/filmes com esta cena voce consegue lembrar? Pelo menos uns três né). Ou ainda aquele inesperado caso de amor entre personalidades e vidas tão opostas. Isso pra manter nossos exemplos no campo da literatura do trágico e do romancinho. Mas, como os exemplos de "plágio" são do tamanho de um infinito, melhor nem continuarmos...


Meu caro autor: voce não é John Green. E eu muito menos. Mas olha, até gostaria que fôssemos, pois assim ofereceríamos aos leitores alegria e lágrimas um pouco melhores. Mas admito, não tenho mesmo ideia de como é o trato das Editoras com seu livro, blog, carreira, enfim, então talvez seja mesmo necessário "repetir de forma diferente" as histórias oficialmente bem aceitas em nossa geração. Afinal, de quê valeria um livro sobre as tribos indígenas do Brasil Colonial em um universo de leitores que só consomem distopias apocalípticas? O autor teria que realmente ser MUITO BOM para se destacar neste 'gosto dominante'. Mas olha, isso aqui é também um grande fato: o que torna um artista Artista é justamente esta capacidade de sobressair em meio ao que é comum. Daí que neste universo de lógica Tostines - inspirada pela fala de John Cusack no início deste post, apenas digo: que haja maneirismo!³. Mas meu caro autor, se esforce pra que tudo seja bem maneiro! Porque uma hora o leitor cansa.




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¹ Aos leitores que eventualmente (também) tenham alguma formação em Humanidades, principalmente Filosofia, deixo aqui a minha nota de rodapé: Não filosofarei sobre o trágico, e tampouco Nietszche. Neste Blog, pretendo mesmo utilizar uma linguagem coloquial, ainda que haja uma (constante e) certa 'banalização acadêmica' em meus textos. Mas olha, realmente "academia" será a última 'coisa' que abordarei neste Blog. Fico feliz por quem tem esta motivação em seus textos, mas no momento esta não será a minha proposta aqui :)

² Como dito na nota acima, a expressão "estilo de época" neste texto não pretende igualmente citar o pensamento-obra de determinado autor a quem academicamente o termo nos cursos de Humanas seja devido.


2 comentários:

  1. Olá ^^
    Que coincidência eu encontrar e ler esse teu texto hoje, pois eu dei uma aula que tratava justamente deste assunto pela manhã. Sobre uma ideia que dá certo e que vários autores/diretores a compram e entram na "onda". O tema que eu estava abordando com os meus alunos era sobre essa "tendência" de readaptar os contos de fadas (como Malévola, Cinderela, etc..) e a discussão que propus era sobre a tal da originalidade.

    Bom, eu sou da máxima de Oscar Wilde: "Para ser popular é preciso ser medíocre."
    Me desculpe se você discorda, mas eu acredito que essa nova onda literária de mocinhas e mocinhos que sofrem e não conseguem o "felizes para sempre" e só mais uma inversão do "felizes para sempre" para agradar leitores já fatigados.

    Belíssimo texto, belíssima escrita. Começarei a acompanhar teu blog ^^

    Beijinhos, Hel.
    http://leiturasegatices.blogspot.com.br/

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  2. Olá, Helena! Muito obrigada por seu comentário-conversa! Ainda mais neste primeiro (e confuso) post aqui do blog rs :)

    Quanto às adaptações dos contos de fadas, tenho que dizer que admiro o trabalho da Paula Pimenta, que de algum modo torna as personagens de época em jovens como as de hoje, e com uma potência criativa que não banaliza os textos originais. Bem, li apenas seu "Cinderela Pop", não sei se você já teve a oportunidade, mas vale muito a pena, e acredito que muitos jovens ainda se identificarão com esta e outras de suas histórias.

    Já em relação ao final trágico em oposição ao felizes para sempre, concordo que haja esta vontade de inserção do jovem autor no "boom editorial" de cada época. E como esta é uma lógica não só deste mercado, importa mesmo o trabalho do docente, do comentador, do crítico, enfim, para discutir estes "vícios" com os jovens leitores, e em seguida torcer para que "alguma coisa mude" caso estes decidam se tornar novos autores no futuro...

    Ainda sobre os contos de fada, confesso que me incomoda ainda mais esse boom da descaracterização de personagens clássicos (no caso, de sua personalidade e essência) para agradar todo um projeto político do contemporâneo (pra não dizer uma "nova engenharia social") e que não tem nada a ver com o mundo editorial em si. Enfim, acho esta questão ainda mais perturbadora que a literatura pop-suicida de nossas prateleiras... Mundo difícil, né. Mas vamos seguindo rs.

    Um abraço,
    Rebeca

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