Hoje acordei às seis e quarenta e dois ao som do despertador do celular que insanamente gritava. Devo ontem ter exagerado no ajuste do volume pois meu gato também acordou e deu início a uma batalha vocal com o telefone, como se quisesse desafiar o Nokia em uma partida de quem tem um agudo mais alto um dois três já.
Prevendo uma possível enxaqueca para este início das sete horas, fui para a cozinha preparar um café e uma tapioca, pois dizem que tapioca é um bom substituto para o pão de forma que só engorda, e a ideia de engordar um pouco menos pelo menos durante a manhã parece bem interessante. Ao terminar o lanche fui para o quarto escolher a roupa do dia, a saber, uma combinação de saia e blusa em uma tonalidade próxima ao cinza-de-chuva deste início de primavera. Também prendi o cabelo em um coque e passei um batom cor-de-nada pois a disposição para a beleza às quase oito é por vezes bem pouca. Calcei botas, peguei minha bolsa marrom e quase esqueci as chaves que ficam no potinho de vidro em cima da mesa de centro.
Prevendo uma possível enxaqueca para este início das sete horas, fui para a cozinha preparar um café e uma tapioca, pois dizem que tapioca é um bom substituto para o pão de forma que só engorda, e a ideia de engordar um pouco menos pelo menos durante a manhã parece bem interessante. Ao terminar o lanche fui para o quarto escolher a roupa do dia, a saber, uma combinação de saia e blusa em uma tonalidade próxima ao cinza-de-chuva deste início de primavera. Também prendi o cabelo em um coque e passei um batom cor-de-nada pois a disposição para a beleza às quase oito é por vezes bem pouca. Calcei botas, peguei minha bolsa marrom e quase esqueci as chaves que ficam no potinho de vidro em cima da mesa de centro.

Para que uma história cotidiana não se transforme em um simples falatório, é preciso que a banalidade e a repetição sejam personagens de maior importância em nosso texto, e não apenas uma quase infinita descrição de atividades, como as de meus dois primeiros parágrafos. Ou seja: de que adianta o leitor saber do personagem a cor de seu pijama ou o sabor de sua pasta de dentes se estas informações contribuem apenas para um maior número de palavras em cada parágrafo e nada mais?
Claro que toda escrita é uma operação de identificação e escolha: um texto que pode ser péssimo pra mim certamente alcançará o coração de muita gente, e vice-versa. Neste universo da leitura, felizmente encontramos um grande grupo disposto a muitos detalhes da vida de seus personagens, assim como também um outro imenso grupo disposto a chegar logo à página onde um telefonema recebido às três e quinze mudará a vida de toda uma cidade.
Em nosso papel de leitores (e eventualmente também escritores), importa descobrirmos as grandes histórias (que ainda silenciosas) no coração dos objetos e cenas que não imaginaríamos dedicar a menor atenção. Um de meus exemplos preferidos é o conto A Marca na Parede, de Virginia Woolf, onde uma simples mancha instiga toda uma narrativa de vida, reflexão e melancolia:
Foi talvez por meados de Janeiro deste ano que vi pela primeira vez, ao olhar para cima, a marca na parede. Quando queremos fixar uma data precisamos de nos lembrar do que vimos. Assim, lembro-me de o lume estar aceso, de uma faixa de luz amarela na página do meu livro, dos três crisântemos na jarra de vidro redonda na chaminé. Sim, tenho a certeza de que foi no Inverno, e tínhamos acabado de tomar chá, porque me recordo de estar a fumar um cigarro quando olhei para cima e vi a marca na parede pela primeira vez. (clique para ler o conto completo)
Veja, caberá sempre em nosso diário (e em nossas conversas cotidianas) a presença destes inúmeros elementos de cena: a descrição da casa, da cidade e da rotina que nos cerca; os detalhes da solidão ou da companhia de nós mesmos e de nossos amigos; enfim, inúmeras falas eventualmente banais, e inúmeras outras eventualmente triunfantes. Acho que é isso: é preciso estar aberto e sensível a todo este mundo que nos fala em silêncio, para que assim os dias encontrem uma maior graça e não se percam em uma lista de amenidades do tipo oi-tudo-bem-comprei-pão-na-padaria-e-ainda-sobrou-cinco-reais.
E foi pensando neste excesso emocional e descritivo de muitas histórias (que nos levam a lugar algum) que pensei em conversar com vocês sobre um livro que (de tão amado por seu público) despertou em mim um interesse imenso de leitura. Só que antes de chegar ao término do livro eu já havia praticamente "terminado" com ele, de tão pouca identificação que tive com o texto. Aliás, isso aconteceu com mais de um livro, infelizmente...

Em O Lado Feio do Amor (Ugly Love), a história é narrada por dois personagens: Tate, a jovem pós-graduanda em Enfermagem que por ocasião do trabalho e da vida volta a dividir um apartamento com seu irmão Corbin; e também Miles, o jovem piloto de feições e músculos perfeitos que por ocasião do trabalho e da vida tornou-se vizinho e melhor amigo de Corbin. E talvez por Colleen ter criado um personagem de aparência tão improvavelmente perfeita sua história tenha também seguido em uma narrativa do tipo improvável, onde apesar de todos os pesares e traumas dos personagens (especialmente os de Miles) todo o impasse sentimental será solucionado para que o livro ganhe um desfecho mais fofo que um filme da Disney.
Melancia, de Marian Keyes, também é um pouco assim (pelo pouco que li, pois confesso que mesmo pulando algumas página e capítulos a história parecia não ter fim, então quis logo ler as últimas páginas para ter a certeza de que revelariam um bom e previsível desfecho para suas personagens).
Enfim... talvez por ter lido toda uma sequência de obras existencialmente melancólicas minha percepção destes dois romances não tenha sido das mais generosas. E certamente gosto dos finais felizes (tanto que vocês já conhecem a minha "indignação" com certos livros onde o protagonista morre na melhor parte da história), e gostaria muito de ter-gostado de Colleen e Marian, mas...
E você, caro leitor, se identifica com esse diário Marian-Colleen de alta sensibilidade e conversas sem fim? Conta pra gente :)
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Colleen Hoover. O Lado Feio do Amor. RJ: Galera Record, 2015.
Marian Keyes. Melancia. RJ: Best Bolso, 2014.
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Colleen Hoover. O Lado Feio do Amor. RJ: Galera Record, 2015.
Marian Keyes. Melancia. RJ: Best Bolso, 2014.
Melancia peca nisso, mesmo. É muito... enrolado, a personagem passa 5 páginas falando sobre coisas banais, quando poderia estar narrando fatos importantes para a história. Esse livro dela é surpreendentemente chato, mas os outros compensam. Já falando da Colleen, nunca li nada dela. :/
ResponderExcluirótimo texto! beijos
whoosthatgirrl.blogspot.com
Comecei a ler Melancia, mas confesso que a história não me cativou. Achei lenta e não avançava.
ResponderExcluirGente! Celular é irritante ¬¬ ontem no trabalho li e comentei sobre esse post, mas o comentário chegou aqui como deveria? Não! aff
ResponderExcluirNo comentário que não veio eu disse algo semelhante: Que gostei muito dos seus argumentos e do exemplo que você mostrou! Tem livros que são realmente chatos pelos excessos de detalhes, e eu mesma paro de ler logo nas primeiras páginas, raramente insisto na leitura, se acontece de insistir desisto do mesmo jeito. Fico seguindo o pensamento de que 'poderia estar lendo qualquer outra coisa em vez do livro chato'. E lembro que quando estudava deixei de apresentar um trabalho importante justamente por me negar a ler um livro cansativo desses (O Cortiço, se não me engano), e fiquei com média 7 justamente por não apresentar! Eu na época já levantava a bandeira do "não sou obrigada!" rsrs
Acompanho você(s) no Instagram e agora cá estou. Não sei demorei tanto tempo para conhecer o blog, estou encantada.
ResponderExcluirTive minha experiência com Melancia há muito tempo atrás, muito mesmo, de modo que nem me lembro muito bem da estória, mas lembro de não ter desgostado. Antes de lê-lo li outros livros da autora e todos são mais ou menos parecidos, são grandes, bastante descritivos... Não sei se a boa impressão vai continuar caso eu os leia novamente agora.
Abraços.
Minhas Impressões