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novembro 22, 2015

[Resenha] Resposta Certa e O Substituto, de David Nicholls

A vida aos dezoito ou trinta pode ser o testemunho de muita coisa que deu certo: bons amigos; faculdade e carreira definidos; um casório, um romance ou algo parecido. Em Resposta Certa e O Substituto, David Nicholls apresenta seus personagens vivendo o contrário de tudo isso.


Em algum momento, gostaria de ter uma ideia original. Gostaria de ser desejado, ou talvez até amado, mas vou esperar pra ver. E, quanto a um emprego, ainda não sei bem o que quero, mas que seja algo que eu não odeie ou me deixe doente, e isso significa não precisar me preocupar com dinheiro o tempo todo. E são todas essas coisas que uma formação universitária vai me proporcionar.
Terminamos as cervejas e as coisas saem do controle. Tone joga meus sapatos no mar e tenho que voltar pra casa só de meias.
(pg. 18)

Brian Jackson é um rapaz de quase 18 anos que ansiosamente aguarda o dia em que deixará a casa dos pais e a companhia de Tone e Spencer, seus melhores amigos, para iniciar uma nova vida como universitário. Como futuro estudante de Literatura Inglesa, Brian levará consigo apenas uma jaqueta, algumas camisas compradas em um brechó e um paletó de veludo marrom herdado de seu pai, cuja combinação o deixará com "o visual de um jovem oficial do exército traumatizado, com uma certa gagueira e um caderno cheio de poesias trazido das brutalidades do front". Além do figurino-de-vovô-com-óculos, nosso jovem protagonista incluirá em sua mala uma coleção de fotografias, livros (poesias, claro, e também uma cópia d'O Manifesto Comunista) e discos, especialmente os da cantora Kate Bush, sua musa de todo o sempre. E será com esta aparência estranhamente idealizada que o jovem Jackson iniciará seus primeiros dias na universidade. 

Como na maioria das histórias de David Nicholls, Resposta Certa é também ambientada na Inglaterra dos anos 1980, onde além da cultura punk, nerd e hippie era necessário ao jovem tomar partido nas disputas políticas da época, a saber, a escolha entre a ala revolucionária dos simpatizantes soviéticos ou a dos jovens conservadores dos times de remo e críquete. E já nas primeiras horas de seu primeiro dia na universidade Brian teria contato com estas duas realidades, especialmente após ter sido acomodado em uma casa-república ocupada pelos esportistas Josh e Marcus, e em sua primeira festa no campus ter sido confrontado por Rebecca, a jovem militante dos partidos estudantis e aparência digna de uma espiã da KGB. E neste caótico reconhecimento de amizades, costumes e territórios, Brian, já um tanto embriagado, encontra num quadro de avisos a chance poderia determinar sua nova vida: o teste de seleção para o time do Desafio Universitário.

Desde criança Brian e seu pai tinham o hábito de assistir programas de perguntas e respostas da TV. E ainda que errassem a maioria das questões, Jackson pai e filho nutriam um gosto por essa Cultura Geral onde o conhecimento de nomes, datas e acontecimentos históricos aliado a teoremas matemáticos e obras literárias poderia ser a oportunidade de ser especialmente lembrado, e quem sabe até bem sucedido. E Brian sempre sonhou com esta notoriedade. Será que no Desafio Universitário ele seria finalmente reconhecido?


Em uma carreira profissional que já durava onze anos, até agora Stephen C. McQueen havia interpretado seis cadáveres, cada um deles (...) comunicando o pathos de não estar vivo. Para não ser selecionado sempre para o mesmo papel, ele omitiu essas experiências no seu currículo, atribuindo aos vários cadáveres nomes intrigantes e carismáticos, como Max ou Oliver, em vez dos mais específicos (...) Cadáver ou Vítima. Mas o fato havia se espalhado pela indústria - ninguém fazia aquilo melhor do que Stephen C. McQueen.
(pg. 16)
Quanto à celebridade, ele não tinha desejo de ser famoso (...); não tinha vontade de se ver num ímã de geladeira ou numa caixa de cereais.(...) Só queria a fama de estar sempre trabalhando. A fama de ser reconhecido.
O que aumentava ainda mais a frustração de estar preso a um trabalho de interpretação que praticamente não envolvia interpretar nada.
(pg. 32)     

Como uma versão balzaquiana de Brian Jackson, o protagonista de O Substituto parece mesmo seguir os passos de nosso jovem estudante do Desafio Universitário: após uma década atuando em papéis inexpressivos no teatro, no cinema e na TV, Stephen C. McQueen (um quase-homônimo do verdadeiro Steve McQueen) ainda acredita que sua vez está apenas chegando, e que o reconhecimento de seus anos de trabalho e estudo logo virá. Algum dia, talvez, mas virá.

Aos dezesseis anos Stephen abandonara o sonho dos pais (uma carreira no ramo da programação de computadores) para dar início a sua "preparação como ator": primeiramente, comprou um exemplar de segunda mão da obra de Stanilavsky e passou a imitar as pessoas que via no ônibus; também começou a fumar, comprou um sobretudo e matriculou-se em diversos cursos de arte. Os anos passaram e após uma década de papéis secundários e pouco dinheiro Stephen conheceu Alison, com quem compartilhou em um período de três anos um modesto apartamento num subsolo de Camberwell, junto a móveis de MDF, garrafas de vinho barato e pôsteres que eram também o "cenário-inspiração" para Sophie, sua filha, que após o divórcio obviamente recebeu a guarda da mãe, desta vez casada com Colin, um banqueiro de investimentos que obviamente as levaria para uma vida em uma mansão de cinema. 

Após inúmeras decepções e terapias, Stephen parece ter finalmente encontrado a oportunidade de sua vida: a participação em um grande espetáculo teatral onde o mundialmente famoso Josh Harper, o 12º homem mais sexy do mundo, encenaria Lord Byron, o poeta e romancista há séculos admirado por toda a Inglaterra. Logo, a peça seria um sucesso e a vida de nosso azarado protagonista poderia finalmente mudar! Não fosse por um pequeno detalhe: Stephen participaria da peça como ator-substituto de Josh Harper. Ou seja, só atuaria como Lord Byron quando Josh se ausentasse dos palcos. Algo que dificilmente aconteceria.

Tanto a história de Brian como a de Stephen é contada em detalhes tão improváveis que é impossível não rir. Mesmo nas piores situações, David Nicholls convida o leitor a lidar com as adversidades de forma bem humorada, como se a empatia pelos personagens atrapalhados fosse um motivo para perseverar em nossas lutas - e igualmente evitar o caminho por eles escolhido. Ambos os personagens (assim como o excêntrico Douglas, de Nós) convivem neste universo de segundas chances e recomeços, não importa se aos quinze, trinta ou cinquenta, e esta 'característica' do autor talvez seja uma de minhas maiores motivações em conhecer mais de sua obra. Para uma observação um tanto menos 'otimista', acrescento: não gostei muito dos desfechos das histórias de Brian e Stephen. Até entendo que ambos foram condizentes com a trajetória de seus personagens, e Nicholls foi generoso em permitir algumas surpresas em cada história; difícil comentar sem spoilers, mas posso dizer que há um final um tanto acelerado para cada personagem, como se tanto o autor como Brian, Stephen e o leitor em uníssono dissessem: "então é isso, chega de tristeza, 'bora pensar positivo que alguma coisa a partir de agora vai ter que dar certo".

O que não deixa de ser um bom conselho.


David Nicholls. O Substituto. RJ: Intrínseca, 2013.
_____. Resposta Certa. RJ: Intrínseca, 2012.

Um comentário:

  1. Rebequinha, sabe que o David é um autor que não me cativou. Eu fiquei decepcionada com o UM DIA. Não gostei da história. Achei o filme mais interessante, acredita? Vai entender. Mas acho que vou dar uma segunda chance pra ele um dia.

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